Wednesday, October 17, 2007

URSS - foi bom enquanto durou

Num “zapping” pela web, deparei-me com o site de anedotas em português – o www.anedotaslisboanet.com –, onde encontrei uma secção de anedotas dedicadas à antiga União Soviética (URSS) e, dada a minha origem moldava, naturalmente captou-me a atenção.
Diga-se de passagem que o site, cuja equipa de criação o descreve como sendo “A melhor selecção de anedotas da Internet”, corresponde perfeitamente à descrição, pois explora o humor inteligente em piadas que fazem rir à gargalhada! Uma das anedotas sobre a URSS, porém, em vez de me alegrar, deixou-me nostálgica.
Passo a explicar.
Na história em questão temos uma professora a perguntar aos alunos onde é que vivem as crianças mais felizes do mundo, ao que estas respondem em coro que é na União Soviética. Seguem-se as perguntas: “Onde é que as crianças têm todos os brinquedos e todos os chocolates e doces que quiserem?” e “Onde é que elas crescem saudáveis e alegres, e seguras em relação ao futuro?". A resposta é a mesma. De repente, ouve-se uma menina a chorar. Quando a professora pergunta qual o motivo da sua lamentação, a resposta é: “Quero ir para a União Soviética!”.
Apesar de ser uma boa piada, deixou-me nostálgica porque passei a minha infância na União Soviética e foi o melhor começo de vida que podia ter tido! Sim, era uma criança feliz, tinha os brinquedos que quisesse (desde que não pedisse aos meus pais um cãozinho robô japonês, claro!), sim, era saudável e não tinha preocupações com o futuro (também não estava propriamente na idade das preocupações…).
Concluí que a ideia que muitos portugueses criaram, com base no senso comum, sobre a qualidade de vida na URSS está algo distorcida.
É verdade que o comunismo foi um sistema cuja idealização não foi bem conseguida, já que se baseava em medidas não praticáveis a longo prazo. No entanto, volto a afirmar que, enquanto durou, o comunismo foi bom. O seu sistema social foi talvez o melhor que existiu até hoje, e isso traduziu-se numa óptima qualidade de vida.
Posso dar o exemplo dos meus pais.
Licenciada em engenharia alimentar, aos seus 22 anos de idade, a minha mãe trabalhava numa fábrica de conservas (de frutas e legumes) e tinha um salário de 120 rubles (a moeda da URSS). O meu pai, licenciado em engenharia mecânica, com 24 anos de idade estava já a trabalhar numa fábrica de peças para máquinas agrícolas e recebia 250 rubles. Os dois recebiam um salário extra, a cada trimestre, e que servia de pé-de-meia. O orçamento familiar era, assim, de 370 rubles por mês, quando pelo preço de um ruble podia-se comprar seis pães! Um carro novo da marca soviética «Jiguli» (eram os carros mais comuns entre a população soviética) custava 7.000 rubles.
Assim que os casais tivessem filhos, o Estado lhes providenciava habitação gratuitamente. Aqueles que tivessem um só filho recebiam do Estado um apartamento ou uma casa T1 (que correspondia a muitos T2 actuais – tinham uma sala pequena, uma sala grande que mais se parecia com um quarto, e um quarto menor, que era o quarto propriamente dito). Os que tivessem dois filhos do mesmo sexo recebiam um T2 ou o correspondente numa casa. Os meus pais, visto que tiveram um menino e uma menina, receberam um T3 (até com a privacidade dos pequeninos a URSS se preocupava!).

Tenho 23 anos e não tenho metade da estabilidade que os meus pais tinham com esta idade. Não é que quisesse ter (dois) filhos, ou estar casada, mas, admitamos, sair da faculdade com emprego garantido e bem remunerado, e com uma casa à nossa espera é algo com que muito poucos podem contar hoje em dia.
Isso tudo não para dizer que gostava que o comunismo voltasse, até porque foram as consequências deste mesmo comunismo que obrigaram a minha mãe a emigrar e a “arrastar” os dois filhos para Portugal, mas apenas para contar àqueles que não sabem que, de facto, houve qualidade de vida na União Soviética.
Foi pena ter durado tão pouco.